Sunday, June 03, 2018

MAIS DO MESMO

No ultimo 31 de maio de 2018, no palco do Teatro Paulo Pontes, apresentou-se o espetáculo de dança Mais do Mesmo.

Havia os que esperavam o óbvio de um evento dedicado a conclusão de uma turma de uma escola de  dança como acontecia sempre.  Na apresentação do espetáculo Mais do mesmo, muitos espectadores esperavam que o evento resultante da conclusão do Curso de Licenciatura em Dança da Universidade Federal da Paraíba fosse algo parecido com os festivais, que são tradicionalmente apresentados no fim de cada ano civil pelas escolas de ballet, que são belos e  agradáveis e tem por objetivo mostrar algo para os familiares verem e fotografarem. Esperava-se algo então que se parecesse com a dança daqueles festivais,algo desligado da realidade social, aquilo que o pensamento tradicional admite como dança.

 Mas o conceito de dança não se restringe apenas a um gosto estético, nem a uma modalidade consagrada pela indústria cultural. A dança que tantos vêem como apenas algo superficial, talvez devido a banalização que é feita através de bailarinas exploradas e vulgarizadas por programas de televisão nos domingos a tarde. A dança é algo mais profundo, uma arte e uma ciência, que é estudada  inclusive no âmbito da pesquisa espacial na pesquisa de movimentação de bailarinos em situações de microgravidade(1).

 Deixemos as questões acerca da teoria da dança para outra oportunidade e voltemos ao espetáculo. Assim, quando o público adentrou a platéia do teatro Paulo Pontes foi recepcionado com um vídeo que mostrava sapatos amarrados em fios de energia elétrica; uma coleção de sapatos que foram atirados por pessoas naqueles fios urbanos construindo um museu a céu aberto. Os pés  contém o primeiro símbolo da dança,o ponto de contato da criatura humana com a terra e naquela imagem estava a chave de que os nossos pés estariam pisando um outro tipo de chão.

É comum que se peça ao espetáculo de dança que todos estejam no mesmo tempo-ritmo, faz parte até do senso comum, há uma música externa, seja um grande balé de um compositor clássico, ou uma seleção de canções da Música Popular Brasileira. Isto é algo presente nas coreografias de grandes grupos de dança; mesmo que a música seja original, o corpo de bailarinos tem um mesmo tempo-ritmo, isto é, seguem uma partitura única, ainda que com muitas vozes. No espetáculo de dança, Mais do mesmo, vemos uma polifonia de corpos, cada qual com sua própria melodia e ritmo, trazendo para a cena algo da  vida real tal como ela é. A excelente música original composta por Esmeraldo Marques não está lá para ser uma partitura que unifica, mas antes um emaranhado de fios, onde os vários sapatos, sandálias e sapatilhas são atirados para flutuarem sobre a cidade.O video que era projetados simultaneamente tornou-se também um bailarino etéreo e parte do elenco.

O espetáculo Mais do Mesmo tem quatro  episódios todos livremente inspirados no livro de Elisa Lucinda “Parem de falar mal da rotina”, sob a assessoria dramatúrgica de Carolina Laranjeira. No principio o diretor subiu ao palco para dar um aviso, mas o que fez foi ir buscar o fio condutor da trama para enreda-lo pela platéia. O episódio “Fios” tratou das relações humanas. No episódio “Babel” tivemos a luta pelo diálogo dentro de uma teia de intenções e pós-verdades. No  episódio “Mesmo?” Se questionou a passividade diante da rotina diária. No episódio “Sapatos” as pessoas lutavam para terem direito a sua história; vimos no corpo de Jessika Andrade, por exemplo, os espasmos de agonia para estar no mundo, lutando pelo direito de ser quem é. Ao final, da mesma forma que iniciou, o diretor subiu ao palco levando consigo os espectadores para a convulsão final com a participação de todos os dançarinos.


Mais do mesmo, foi resultado da prática de  criação artística em dança, que foi desenvolvida em grupos sob a orientação e direção geral de Guilherme Schulze e foi livremente inspirado no livro de Elisa Lucinda,Parem de falar mal da rotina .Música original de Esmeraldo Marques.Vídeo design: Paulo Rocha. Iluminação: Fabiano Diniz. Câmera e edição(Fios): Rosilvaldo Silva(Erre). Produção-executiva: Juliana Costa Ribeiro. Assessoria para criação de figurinos: Paula Coelho. Assessoria para criação dramaturgica: Carolina Laranjeira.Arte Gráfica: Jessika Andrade. Elenco: Cristina Resende, Danielle Caldas, Dayse Torres, Emiliano Lopes, Érica Bernardo, Ewellyn Lima, Jack Keysy, Janielle Nálija, Jéssika Andrade, Jonas Flex, Karen Cabeluda, Kilma Farias, Laís Luah, Lucas Dias, Maeza Donnianni, Maíra Rodrigues, Marlyson Barbosa, Micalene Cavalcante, Nady Rodrigues, Rafael Sabino, Rodrigo Almeida, Taciana Negri, Veronica Valentim.






NOTA

1 - DUBOIS, Kitsou. Analogy between training for dancers and problems of adjustment to microgravity: an evaluation of the subjective vertical in dancers. Acta astronautica, v. 25, n. 8-9, p. 605-613, 1991.

No comments: