Wednesday, August 27, 2014

BULIR OU NÃO BULIR

 “Bulir ou não bulir” foi um espetáculo montado por Cely de Freitas sobre Bullying, um tema  atual, presente nas escolas, nos ambientes de convivência, nas praças, nas praias, nos parques e mesmo dentro do lar. No entanto, dentro do ambiente familiar, este é um tema secreto porque a maioria das pessoas tenta negar a existência deste mal costume, este maltrato infligido ao mais frágil como se fosse algo natural, algo que acontece sem remorsos,  algo que pode ser tolerado pela soberba,  algo que de uma certa forma pertence ao modo de vida das pessoas emocionalmente adoecidas .

 Então quando tratamos desse tema – Bullying - geralmente procuramos nos referir aos casos extremos quando acontecem tragédias como as que ocorreram nas escolas brasileiras e norte-americanas, quando estudantes invadem a sala de aula armados, matam seus colegas, professores e depois confessam, que tudo isso começou com o fato de serem o maltratados no meio estudantil.

 O espetáculo da Companhia Encena traz esse tema para palco de forma brilhante, porque dirige-se exatamente ao público que pratica o Bullying e que recebe a mensagem de que é vítima e algoz ao mesmo tempo. Falar para crianças e adolescentes é algo muito difícil, porque é um outro universo, um outro mundo e as pessoas costumam se dirigir aos jovens como donos da verdade aplicando uma lição. Se esta estratégia já não funcionava há anos atrás sem o grau de liberdade que se tem hoje, imagine no momento  atual onde as coisas ficaram muito mais difíceis com adolescentes, que são incentivados a terem uma liberdade muito maior: liberdade sexual;  liberdade de pensamento;  liberdade de ação.

Esta liberdade juvenil se tornou uma liberalidade exagerada, de tal sorte que a independência do indivíduo já surge bem antes dela  se tornar adulta e dona de seu próprio nariz assumindo o bônus e ônus de suas ações. Há poucas décadas atrás a vida independente começava aos 18 anos e ainda assim estava sob os olhares do pai e da mãe. Hoje uma criança, praticamente a partir de 5 anos de idade ou menos, já começa a ter atitudes que afrontam a autoridade dos pais. Os pais por sua vez, herdeiros do sonho dourado da era de aquários, tem dificuldade em distinguir o exercício legitimo da autoridade com os excessos do autoritarismo.

Nos dias atuais, temos leis que combatem esse excesso violento da autoridade parental, que protegem a individualidade da criança e do adolescente, que proíbe aos pais de tomarem atitudes mais severas; lembrando que algumas atitudes severas precisam ser tomadas pelos pais antes que a sociedade precise intervir. O fato é que, por outro lado, também os pais abusam desse poder pátrio sobre os filhos com violência.
 É preciso reconhecer que é algo difícil conciliar esses dois universos; o universo de uma educação para a liberdade e os estímulos para uma vida hedonista.

 O Bullying começa em casa onde  a lei do mais forte impera e se estende até a escola onde os mais fracos são os bobos da existência humana.  Nas escolas os alunos dos primeiros anos sofrem com os alunos dos anos seguintes; os das séries doensino  fundamental sofrem com os do ensino médio; os do ensino médio do terceiro ano se consideram muito mais potentes que os do primeiro. E na universidade já se tornou a tradição o bullying institucionalizado da calourada.

 O interessante no espetáculo Celly de Freitas é que aborda esse tema, se dirigindo aos estudantes e aos adolescentes utilizando a linguagem da música Techno. O espetáculo tem o formato de  um clipe musical. Celly faz o papel de um DJ que rege o espetáculo que é dançado num ritmo alucinante atraindo a sua jovem plateia. É um artifício brilhante, pois  através da música executada no palco as cenas fluem tocando nas diversas questões que afligem  a vida do adolescente, sem moralismo, sem chatice e sem complicações.

No espetáculo vemos muitos dos problemas que ocorrem na escola: as dificuldades do menino inteligente e do menino que tem problemas de aprendizagem; dos que são homossexuais; do que é negro, branco, índio ou  asiático. Todas estas situações se sucedem dentro do espetáculo costuradas por essa musicalidade. É um espetáculo de teatro com características multimídia, muito fácil de adaptar ao pátio da escola, nas condições precárias que os estabelecimentos educacionais, ricos ou pobres, oferecem ao teatro.

 Vi Bulir ou não Bulir  no Teatro Lima Penante, no encerramento da 21ª Mostra de Teatro do Estudante com a platéia lotada de jovens. No elenco: atrizes experientes como Rebecca Menezes, excelente em cena; Taís Araújo muito bonita e segura em sua performance. Os dois atores Glaydson Gonçalves, Joseph Rodrigues  estão maravilhosos. Criação de figurinos Tainá Macedo, confecção Maria José Rodrigues, máscaras Tina Medeiros Salles e fotografias de Marcus Mendes.

O espetáculo de Celly é uma das coisas boas que acontecem na cidade e mostra também como o teatro da cidade de João Pessoa começa a ser feito de forma melhor com alunos que vêm do curso de Bacharelado em Teatro da UFPB.  A maioria dos atores são do curso de teatro.


O teatro tem o poder de ir em todos os  lugares,  levantar a discussão e mobilizar as pessoas. O espetáculo de Celly me lembra a fase de Augusto Boal, que teatro não faz a revolução, mas é um ensaio para a revolução.Parafraseando:  o teatro não faz a mudança, mas provoca a mudança desencadeando o debate. 

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