Tuesday, October 25, 2011

ADEUS À SALA GROTOWSKI

Hoje, são 25 de Outubro de 2011.

Ontem escutei dos alunos do curso do Bacharelado de Teatro da UFPB o comentário:  “ A UFPB deu um calote no MEC”. Eles se referiam ao fato de que uma construtora autorizada pela Reitoria começou a demolição do Laboratório de Artes Cênicas, edificação que havia sido elogiada pela comissão de avaliação do curso pela comissão do MEC quando esteve em reunião com o corpo discente. A referida sala teve inclusive várias melhorias implementadas somente para receber a comissão de avaliação.

- "A troca do piso da sala foi èké, professor", comentou um dos alunos. Èké é uma palavra do idioma africano Iorubá que significa fraude, falsidade.

Todos sabem que sempre fui contra a demolição da única sala experimental de teatro da UFPB,  pensada para ser um Laboratório de Artes Cênicas inspirados em Grotowski.  Demorou-se quase 17 anos para se levantar o prédio, sempre com muita oposição de muitos lados, pois é difícil optar por uma arquitetura teatral do século XX, quando a hegemonia são os modelos com palco e platéia à italiana do Século XVII.

Tenho muito receio quanto a derrubada do Laboratório de Artes Cênicas, a nossa Sala Grotowski: 

Primeiro, que estávamos pondo no chão um Teatro Laboratório inspirado em Grotowski, que somente precisaria de cerca de 20 mil Reais para concluir o urdimento e refazer o sistema de arquibancadas. Chamamos de urdimento a uma grade de aço que fica sobre todo o espaço cênico permitindo que se pendurem equipamentos de luz, cenários e equipamentos  circenses já que o curso possui disciplinas na área de circo. Grotowski,  foi um importante homem de teatro no século XX que através de seu "Teatr Laboratorium" (Teatro Laboratório), na cidade de Wrocław , Polônia,  deu importantes contribuições às artes cênicas.

Segundo, que seria uma temeridade colocar abaixo uma construção que tinha feito parte da avaliação do curso de Teatro, que fez o reconhecimento do diploma do curso com a nota máxima. Tudo bem, o CCHLA, e a UFPB devem ter idéia de que terão que colocar no lugar algo que esteja à altura, já que o Departamento de Artes Cênicas pleiteia inclusive o oferecimento de um Mestrado em Artes do Espetáculo.

Terceiro, que seria algo bastante ruim começar as obras em pleno semestre letivo, com as aulas acontecendo na referida sala. Mas a construção começou sem que houvesse uma reunião prévia com os estudantes. Agora os alunos estão na rua sem uma sala específica para realizarem o seu processo de aprendizagem. Eu sei que na cabeça dos administradores o teatro é algo que pode ser feito no meio da rua e não merece qualquer atenção. É lamentável.

Quarto, que a atual administração tem construções que se arrastam por um longo período de tempo. Então, é de se esperar que fiquemos sem espaço adequado enquanto o "novo edifício de teatro" estiver sendo  construído. Acho que por obrigação moral a UFPB irá colocar o curso de teatro  nas dependências do novo prédio da CCTA (Complexo de comunicação Turismo e Artes) que tem algumas salas amplas  e depois no Centro Cultural da UFPB, que  deverá ser inaugurado em 2012.

A derrubada já começou; então, não é demais lembrar que o curso de Teatro ficará muito prejudicado não se o atual reitorado não mantiver  a sua palavra de fazer as obras do novo prédio  sem atrasos.

Os antigos monges do deserto já diziam que é necessário que advenha períodos de destruição e caos para que depois se restabeleça o que é bom, geralmente os escombros soterram as coisas antigas.  Acredito que um dia o Laboratório de Artes cênicas, a nossa Sala Grotowski será reconstruída. Como dizem os místicos, temos tempo, enquanto a destruição trabalha para derrubar o agora, nós trabalhamos para ver triunfar a beleza e o bem pelos milênios adiante. 

Eu sei que estou apenas pondo no papel eletrônico deste meu blog um último desabafo.  Irei agora me colocar em outra caminhada acadêmica, que é trabalhar na direção de outros objetivos  e me afastar completamente das preocupações com construções  e outras coisas mais. Sinto-me profundamente só.

Como este é um evento único na história do teatro brasileiro, ele deveria se tornar ponto turístico  e poderia até ser colocado no folder da PBTUR. Quem quisesse ver a derrubada de uma sala experimental de teatro deveria se deslocar  ao Campus Universitário da UFPB em João Pessoa, em direção da Caixa Econômica Federal; procurar pelo prédio conhecido como “Abacatão”. Qualquer estudante do curso de Teatro poderá lhes dar mais informações. Será possível ver também alguns ensaios sendo realizados debaixo das árvores e se poderão fazer algumas fotografias com os alunos-atores para se colocar no álbum de recordações.

Hoje, quando chegamos para a aula da disciplina Interpretação I,  que estava alocada para a sala preta, a nossa Sala Grotowki,  fomos detidos pelo barulho da serra elétrica derrubando as arquibancadas.

É uma situação de muita dor ver a derrubada de um teatro experimental de nosso tempo. Não custa repetir que o modelo de teatro aceito pela reitoria é do século XVII.

 Ficamos sentados na calçada em frente ao prédio em demolição mantendo o espírito de alegria e sobrevivência que sempre caracterizou os atores. Como diz Amir Hadad, grande diretor e mestre do teatro brasileiro, “nós estamos nas ruas há milênios, nas praças públicas e nos palácios dos reis, representando  os vícios e as virtudes humanas, e ás vezes o fazemos tão bem que chegamos a nos confundir com eles”.

E parafraseando Amir, estamos na rua; olhe nós aqui outra vez. Montamos a nossa "sala azul" e fomos para o pátio em frente ao prédio. Esta estrutura de teatro experimental deverá ser a nossa sala de aula de Interpretação I até o final do período 2011.2 .

Seguem abaixo algumas fotos de hoje.





8 comments:

carloscartaxo said...

Belo texto! Tem a leveza e a densidade da história do teatro paraibano.

Rachel Domingues said...

Querido Everaldo, essa situação toda me lembra a torre (carta do tarô), que ao ser atingida por um raio sofre o impacto, provocando a queda de muitos tijolos. Essa carta lembra também a falta de capacidade do homem em resolver de forma satisfatória uma determinada situação externa, e isso o afeta de uma tal maneira que ele despedaça a sua própria condição interna e de outros. Em geral indica dificuldades, no qual tudo tende a ser resolvido com presunção, sem atender o chamado do bom senso ou aos conselhos de outras pessoas, porém o aprendizado que uma torre nos traz é fantástico, portanto meu querido e caro amigo lembremo-nos que de fato aceitar a torre é o primeiro passo para se chegar a estrela que nos espera com sua luz linda e verdadeira, e nos liberta das ilusões.

ॐ passarinho falante ॐ said...

Depois da estrela vem a lua que é uma ilusão se não a noite escura que é o 18 a soma do 6 6 6 mais a madrugada é sempre mais escura antes do amanhecer antes de vir o sol e iluminar tudo, depois de um grande mal vem sempre um grande bem é o equilíbrio estar na cara que grandes e boas coisas vão acontecer com o departamento mais antes um pouco de provação e algumas coisas mais que aconteceram pra lapidar os escolhidos mais no fim encontrarão o sol o julgamento e o mundo.
AM.rc

Vitor Blam said...

Tantas são as lembranças dessa sala! acredito que todos, ao seu modo, estão sentindo esse período de transição de nosso departamento. Porém é certo que deste ponto em que estamos, temos que nos manter unidos e cobrar seriedade por parte dos responsáveis pela obra, para que ela seja concluída dentro do prazo (pois conhecemos muito bem a realidade das construções na UFPB!) e vamos com fé galera!

Keila Fonseca said...

Oi Everaldo, eu que tive tantos momentos criativos intensos na sala preta com os alunos da graduação enquanto substituta sei a ferida que deve estar aberta em vcs nesse momento e lamento muito jamais poder novamente experimentar o prazer criativo nesse espaço.
Esse sempre foi um local abandonado pela administração do Campus, há muito merecia uma reforma, inclusive para garantir a segurança e acessibilidade a todos, além de urdimento, piso e base de sustentação.
Me pergunto se, de posse do poder de manejar essa poderosa arma que é o teatro, o curso não poderia se mobilizar na tentativa de exigir a garantia de construção de um outro espaço como esse no prédio novo.
Lembrem-se: teatro bom é teatro que incomoda. Talvez essa seja a hora de incomodar quem interessa...

Osvaldo Travassos Sarinho said...

Minhas condolências...

Sarah Canti said...

Eu, nen desespero mais..., muitas lembrancas de dentro de mim nun tem reitorzinho nen serra elétrica que tire !

wallyson Ribeiro said...

Grande Everaldo, concordo contigo enquanto a rejeição da derrubada da nossa sala preta, mas nós não podemos fazer nada enquanto a derrubada e não podemos nos frustar e sim continuar com o belo trabalho de sua disciplina e nos adaptando ao que vier e também rezar-mos com bastante FÉ CÊNICA que um dia será reconstruida a nossa sala Grotowski!
Nós esperamos que este dia chegue!!