Monday, April 20, 2009

ESPARRELA

Um espetáculo sobre o destino, sobre a eterna busca de sentido para a existência humana. Esparrela em cartaz no Teatro Bigorna, com texto, direção e interpretação de Fernando Teixeira, nos leva a pensar sobre as nossas vidas, pois evoca os koans do Zen Budismo, aquelas estórias metafóricas e enigmáticas que provocam a nossa reflexão. Nós todos vivemos a cada dia o mistério de acordar e lutar pela sobrevivência física e psíquica, procuramos o amparo de crenças materialistas ou espiritualistas, às vezes aceitando a prisão confortável que as circunstâncias nos impõe. Contudo, sempre nos defrontamos com os momentos em que somos convidados a encarar a nossa liberdade como o bem mais precioso.

A coragem de desnudamento do ator é um ato de libertação. Fernando Teixeira se expõe diante do público, numa apresentação especial de pré-estréia, diante dos amigos, alunos, ex-alunos e admiradores, talvez a mais cruel de todas as platéias, porque o conhece bem e espera dele a exibição perfeita. Fernando já nos encantou com o monólogo também de sua autoria, Um Tomate esmagado por um carro, nos idos dos anos 90, cujos ecos ainda se fazem ouvir em Esparrela. O ator experiente, que foi aluno de Eugênio Kusnet, hipnotiza a todos; ao final se desculpa por falhas que sequer foram percebidas.

Esparrela conta a estória do urubu Arquimedes e sua saga libertária. Um dia ele cai numa armadilha e é obrigado a dançar em cima de uma lata ao som de uma flauta nas feiras das cidades do interior. Manoel, o seu algoz, vai destilando para a ave os seus traumas, explicando os próprios infortúnios. Arquimedes, por momentos, acomoda-se à situação gostando do sucesso que faziam pelos lugarejos, até que uma fatalidade mata o homem, e então o urubu precisa voltar a viver a sua vida. Quantas vezes nós nos deixamos prender por pessoas, situações do passado, ou aparências, semelhantes ao Arquimedes; no seu vôo de emancipação nós voamos com ele.

A música original composta por Escurinho criou um ambiente mágico que proporcionou aos espectadores uma espécie de transe teatral. A luz criada por Jorge Bweres acentuou este aspecto onírico. A Cenografia de Osvaldo Anzolin praticamente construiu um novo lugar para o teatro em João Pessoa; ele também assinou a assistência de direção. O figurino feito por Adriano Bezerra optou pela simplicidade. O trabalho corporal e coreográfico foi coordenado por Guilherme Schulze. Foi muito importante ver a participação das alunas Ana Raquel Apolinário e Pollyanna Barros, do Curso de Teatro da UFPB, como estagiárias no processo de construção do espetáculo, sendo que Pollyanna continuou fazendo a operação de som.

O novo espaço do grupo Bigorna, já é saudado pelos artistas e pelo público, como o Teatro Bigorna, com capacidade para 50 pessoas. João pessoa necessita de pequenos teatros que permitam a circulação de espetáculos além das casas tradicionais. O Teatro Bigorna se localiza no antigo Grupo escolar Thomas Mindello, onde hoje funciona uma central de organizações não-governamentais e já abrigou o Teatro Cilaio Ribeiro, que está desativado.

O público precisa ir conferir até o fim de maio, às sextas e sábados, às 20 horas, a garra deste ator, autor e diretor paraibano e participar da estória de Arquimedes, que traz à lembrança o Fernão Capelo Gaivota , mas atualizado para a realidade crua.

1 comment:

Anonymous said...

Everaldo,
Emocionado com sua bela crítica, vc entra por melindres da estória e desvenda detalhes que até para mim são novos.
Agradecido.
beijos
fernando teixeira