Wednesday, May 06, 2009

QUEBRA-QUILOS

O teatro participa da construção simbólica da sociedade, não é apenas um entretenimento para afagar as agruras do dia a dia, não é um copo d'água para aliviar o calor. O teatro é um dos construtores de sentido social, ao equacionar as conjunturas com os seus cenários, personagens e o conflito entre o protagonista e os seus adversários, revela a intricada luta pela vida. O teatro passa a revelar a estrutura profunda das lutas sociais que ficam invisíveis no drama comum e além das angústias existenciais de personagens preocupados apenas com o seu próprio destino, mostra a luta de todo um povo, desmascara a pretensa paz social demonstrando a opressão e as estratégias de poder das classes dominantes.


O espetáculo do Coletivo Teatro Alfenin, que pude assistir, quando de sua temporada na Escola Piollin, analisa teatralmente os fatos em torno da revolta do quebra-quilos, que ocorreu no sertão nordestino, em meados do seculo XIX, tendo como pano de fundo a mudança do sistema antigo para o sistema métrico decimal. O espetáculo vai revelar a desigualdade social, a ação injusta dos proprietários do grande latifúndio mancomunados com os governos da cidade, da Província e do Império. A ação dos quebra-quilos que passaram á história como homens sem cultura contrários ao desenvolvimento e ao progresso, toma outra feição, revelando os ideais republicanos contra uma aristocracia agrária escravocrata e retrógrada.


O espetáculo tem no elenco: Zezita Matos, Soya lira, Sebastião Formiga, Daniel Porpino, Daniel Araújo, Verônica Sousa, Roberta Alves. O texto e direção é de Márcio Marciano, que vem da Companhia do Latão de São Paulo. Ele trouxe para Paraíba o referencial teórico daquele grupo que trabalha com o teatro épico de Bertold Brecht.


O grupo foi classificado para o Festival Latino Americano de teatro, tem feito outras temporadas com muito sucesso.


A sua cenografia é um tablado quadrado, cujas bordas possuem caixas rasas com as mercadorias de uma feira livre, como feijão, milho, arroz, farinha, fubá, carne seca, frutas, verduras, fumo de rolo, evocando diretamente a problemática do sistema de pesos e medidas que alterou o modo de funcionamento do comércio. Os atores ficam sempre à vista do público em cadeiras que circulam o palco pelo lado oposto ao público, quando eles não estão em cena, manejam os instrumentos musicais que produz todos os efeitos sonoros do espetáculo, que possuem várias canções que servem de comentário para a ação. Os figurinos evocam os costumes do seculo XIX, mas sem uma intenção naturalista. A interpretação dos atores procura muito mais a cumplicidade dos espectadores do que a empatia. A iluminação recorta com precisão cada momento, enfatizando os ambientes com sobriedade. Os adereços de cena adquirem uma grande força dramática pois são manuseados como objetos de poder. O grande poder da convenção teatral é manejado com mestria pelo diretor.


O Coletivo de Teatro Alfenin é atualmente um dos mais importantes referenciais do teatro de pesquisa no estado da Paraíba. Eles não estão interessados em medir forças com nenhum outro grupo ou pessoas, são até um pouco reclusos, simplesmente realizam o seu trabalho com perfeição.

No comments: