Monday, January 23, 2012

ANÁGUAS



Os espectadores entram no teatro e são convidados a irem ocupar um espaço entre três pequenas escadarias onde estão localizadas três mulheres. Os assentos tem um tom de interior, lembrando aqueles tamboretes  dos terraços das casas de sitio. A iluminação  centralizada neste espaço numa cor âmbar  escuro faz do ambiente um lugar que cria um clima de tensão. O espaço é triangular, com estes três feixes de energia vindo das personagens cada qual localizada numa das quinas deste triangulo. 

Depois do público sentado,  ouve-se um cântico uníssono  das três atrizes cantando, "Ah, caninana, cobra criada, cobra morreu". É o sinal de que estamos agora todos imersos naquele universo de disputa feminina. De fato, o espaço cênico lembra um ringue de MMA (Martial Mix Arts), hoje tão em voga. O MMA é uma das lutas mais violentas já inventadas e toleradas como um esporte. Pois bem,  os espectadores são colocados dentre deste ringue.

Cada uma das três mulheres, Maria da Graças, Maria Exaudrina e Maria Cândida, descem  as escadas e passam a contar para os espectadores que estão próximos a cada uma delas  as suas lembranças,  mostrando-lhes  um álbum de fotografias. Gera-se um uníssono de conversas, que ao poucos revela a hierarquia entre elas.

 Maria das Graças, a mãe, viúva, está preparando os seus últimos dias de vida. Ela tem outros 18 filhos que não tiveram a mesma sorte que as filhas Maria Exaudrina e Maria Cândida. Estes outros filhos  são os desvalidos que ela  deseja que sejam protegidos após a sua morte.

Aos poucos estes três pólos de força vão revelando as personalidades destas três mulheres que apresentam as suas dores.

Maria Exaudrina, que não se casou e teve o seu noivo roubado por Maria Cândida. No desenrolar da trama descobre-se que Maria Exaudrina tinha mantido uma relação incestuosa com o próprio pai.

Maria Cândida, quebrando todos os tabus e costumes da família, dedicou-se a arruinar os casamentos de outras moças e tem uma vida completamente livre de qualquer preconceito. Ao final irá ter um filho de pai desconhecido.

 Maria das Graças, preparando a própria morte, faz o seu testamento deserdando Maria Exaudrina e Maria Cândida em favor de seus filhos desvalidos que não conseguiram se estabelecer na vida.
Em determinado momento do espetáculo, as três mulheres a titulo de banharem-se, fazem como uma espécie de mudança de pele retirando as camadas que as faziam tão duras.

No momento final, a morte da mãe impõe outra direção na vida das duas irmãs deserdadas. Maria Exaudrina fica com a tarefa de  cuidar dos irmãos desvalidos, enquanto Maria Cândida larga-se pelo mundo.

O texto, de Lourdes Ramalho, lembra os Mal Amados também de sua autoria. Em Anáguas, texto que não foi feito para mostrar ações exteriores, visto que tudo se passa dentro do universo interior de cada uma delas, é adequado a espaços experimentais.

 O diretor estreante José Maciel, que viveu toda a sua carreira teatral até este momento  como ator, mas que agora premido pelo seu amor a dramaturgia de Lourdes Ramalho,  trouxe-nos este belo espetáculo que põe em xeque a condição humana. Ele também assina a cenografia junto com Jacinta de Lourdes.

As atrizes,Margarida dos Santos(Maria das Graças ), Mônica Macêdo(Maria Exaudrina ) e Palmira Palhano( Maria Cândida) são três grandes nomes do teatro paraibano, que estavam já fazia algum tempo distantes dos palcos, coisas que a vida obriga, mas que por necessidade vital elas terminaram voltando e se encontrando num momento muito bom para o teatro. Todas as três vêm do de uma vida teatral longa iniciada no inicio dos anos oitenta, na dura e árdua batalha do teatro na Paraíba.

Os figurinos de Tainá Macedo compõem de maneira elegante o visual, contribuindo inclusive para a construção cenográfica.

As músicas são originais  e foram compostas por Angélica Lacerda,  Marcos Fonseca e Misael Batista. Marcos Fonseca  fez  a direção musical que deu  ao espetáculo uma sustança, como diz o matuto, que faz tremer o coração dos espectadores, construindo uma musicalidade crua que remete aos terreiros das casas grandes dos sertões da Paraíba.

 Os espectadores participam do espetáculo; ao final quando se faz o velório da matriarca Maria das Graças todos os espectadores colocam  um véu negro, que tem a propriedade de colocar todos dentro do mesmo lugar. É possível observar que os espectadores assumem-se como parte da representação e  como  participantes do velório. É interessante notar esta mobilização inconsciente por parte de todos os presentes. As atrizes cantam com muita verdade surpreendendo aqueles que já haviam esquecido suas presenças no palco,  tão mergulhados que estavam na solenidade fúnebre. 

A segurança das atrizes  em cena confere ao espetáculo um brilho especial demonstrando o acerto da direção na escolha do elenco.

Este espetáculo que somente pode receber trinta espectadores por apresentação devido à sua arrumação em torno do triângulo de forças merece que seja visto por todos, em especial os que acompanham o trabalho da dramaturga Lourdes Ramalho. A produção executiva foi de Jamil Richene.

Nas fotos: Palmira Palhano, Margarida dos Santos e Mônica Macêdo.





1 comment:

Peter said...

cade a divulgação na imprensa?O Teatro Ednaldo do Egito é na praia,para quem só anda de GOL (Grande Onibus Lotado)é inconveniente,Mas espero no Santa Rosa ou Paulo pontes.Como se diz no teatro "Quebrem as Pernas".
Torço pelo sucesso