Os espectadores entram no teatro e são convidados a irem
ocupar um espaço entre três pequenas escadarias onde estão localizadas três
mulheres. Os assentos tem um tom de interior, lembrando aqueles tamboretes dos terraços das casas de sitio. A iluminação centralizada neste espaço numa cor âmbar escuro faz do ambiente um lugar que cria um
clima de tensão. O espaço é triangular, com estes três feixes de energia vindo
das personagens cada qual localizada numa das quinas deste triangulo.
Depois do público sentado,
ouve-se um cântico uníssono das três
atrizes cantando, "Ah, caninana, cobra criada, cobra morreu". É o
sinal de que estamos agora todos imersos naquele universo de disputa feminina.
De fato, o espaço cênico lembra um ringue de MMA (Martial Mix Arts), hoje tão
em voga. O MMA é uma das lutas mais violentas já inventadas e toleradas como um
esporte. Pois bem, os espectadores são
colocados dentre deste ringue.
Cada uma das três mulheres, Maria da Graças, Maria Exaudrina
e Maria Cândida, descem as escadas e
passam a contar para os espectadores que estão próximos a cada uma delas as suas lembranças, mostrando-lhes um álbum de fotografias. Gera-se um uníssono
de conversas, que ao poucos revela a hierarquia entre elas.
Maria das Graças, a
mãe, viúva, está preparando os seus últimos dias de vida. Ela tem outros 18
filhos que não tiveram a mesma sorte que as filhas Maria Exaudrina e Maria
Cândida. Estes outros filhos são os
desvalidos que ela deseja que sejam protegidos
após a sua morte.
Aos poucos estes três pólos de força vão revelando as
personalidades destas três mulheres que apresentam as suas dores.
Maria Exaudrina, que não se casou e teve o seu noivo roubado
por Maria Cândida. No desenrolar da trama descobre-se que Maria Exaudrina tinha
mantido uma relação incestuosa com o próprio pai.
Maria Cândida, quebrando todos os tabus e costumes da família,
dedicou-se a arruinar os casamentos de outras moças e tem uma vida completamente
livre de qualquer preconceito. Ao final irá ter um filho de pai desconhecido.
Maria das Graças,
preparando a própria morte, faz o seu testamento deserdando Maria Exaudrina e Maria
Cândida em favor de seus filhos desvalidos que não conseguiram se estabelecer
na vida.
Em determinado momento do espetáculo, as três mulheres a
titulo de banharem-se, fazem como uma espécie de mudança de pele retirando as
camadas que as faziam tão duras.
No momento final, a morte da mãe impõe outra direção na vida
das duas irmãs deserdadas. Maria Exaudrina fica com a tarefa de cuidar dos irmãos desvalidos, enquanto Maria
Cândida larga-se pelo mundo.
O texto, de Lourdes Ramalho, lembra os Mal Amados também de
sua autoria. Em Anáguas, texto que não foi feito para mostrar ações exteriores,
visto que tudo se passa dentro do universo interior de cada uma delas, é adequado
a espaços experimentais.
O diretor estreante
José Maciel, que viveu toda a sua carreira teatral até este momento como ator, mas que agora premido pelo seu amor
a dramaturgia de Lourdes Ramalho, trouxe-nos este belo espetáculo que põe em
xeque a condição humana. Ele também assina a cenografia junto com Jacinta de Lourdes.
As atrizes,Margarida dos Santos(Maria das Graças ), Mônica
Macêdo(Maria Exaudrina ) e Palmira Palhano( Maria Cândida) são três grandes
nomes do teatro paraibano, que estavam já fazia algum tempo distantes dos palcos,
coisas que a vida obriga, mas que por necessidade vital elas terminaram
voltando e se encontrando num momento muito bom para o teatro. Todas as três
vêm do de uma vida teatral longa iniciada no inicio dos anos oitenta, na dura e
árdua batalha do teatro na Paraíba.
Os figurinos de Tainá Macedo compõem de maneira elegante o visual,
contribuindo inclusive para a construção cenográfica.
As músicas são originais
e foram compostas por Angélica Lacerda,
Marcos Fonseca e Misael Batista. Marcos Fonseca fez a direção
musical que deu ao espetáculo uma
sustança, como diz o matuto, que faz tremer o coração dos espectadores, construindo
uma musicalidade crua que remete aos terreiros das casas grandes dos sertões da
Paraíba.
Os espectadores
participam do espetáculo; ao final quando se faz o velório da matriarca Maria
das Graças todos os espectadores colocam
um véu negro, que tem a propriedade de colocar todos dentro do mesmo
lugar. É possível observar que os espectadores assumem-se como parte da
representação e como participantes do velório. É interessante notar
esta mobilização inconsciente por parte de todos os presentes. As atrizes
cantam com muita verdade surpreendendo aqueles que já haviam esquecido suas
presenças no palco, tão mergulhados que
estavam na solenidade fúnebre.
A segurança das atrizes
em cena confere ao espetáculo um brilho especial demonstrando o acerto
da direção na escolha do elenco.
Este espetáculo que somente pode receber trinta espectadores
por apresentação devido à sua arrumação em torno do triângulo de forças merece
que seja visto por todos, em especial os que acompanham o trabalho da
dramaturga Lourdes Ramalho. A produção executiva foi de Jamil Richene.
Nas fotos: Palmira Palhano, Margarida dos Santos e Mônica Macêdo.
1 comment:
cade a divulgação na imprensa?O Teatro Ednaldo do Egito é na praia,para quem só anda de GOL (Grande Onibus Lotado)é inconveniente,Mas espero no Santa Rosa ou Paulo pontes.Como se diz no teatro "Quebrem as Pernas".
Torço pelo sucesso
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